UMA PALAVRINHA SOBRE SUTIÃ por DEONISIO DA SILVA
O Blog hoje está impossível, está com tudo e com motivo, estamos prosas!
Nosso convidado é o Professor Deonísio da Silva, que nos dá essa colher de chá maravilhosa, nos honrando com esta cronica escrita especialmente para o 40 Forever!
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UMA PALAVRINHA SOBRE SUTIÃ
“Escritores usam sutiã! Jornalistas também! É frequente o uso de sutiãs entre os que redigem. Quem faz dicionários, também usa sutiã!
Há mais significados sob as palavras do que supõem nossos parcos saberes. Todavia o sutiã utilizado pelos profissionais do parágrafo anterior não é o fetiche encantador do vestuário feminino, talvez a primeira peça com a qual o ser humano dá de cara (ou de boca!) nos primeiros meses de vida, quando a mãe descobre os seios para amamentar o rebento.
É que sutiã tem outro significado, assim fixado no Dicionário Aulete: “Frase colocada depois do título e que serve para complementar o mesmo; subtítulo.”
No seu significado predominante, sutiã veio do Francês soutien, designando peça íntima para sustentar, modelar ou simplesmente enfeitar os seios.
Há sutis e complexas diferenças nas línguas francesa e espanhola para esse sortilégio, esse amuleto da lingerie, que, aliás, tem este nome porque as primeiras vestes femininas íntimas foram feitas de lin, linho, substantivo francês que está na origem do adjetivo lingerie, feito de linho.
As espanholas usam sujetador, significando dominador. Isto é, para as espanholas, o sutiã domina algo que pode escapar. Para as francesas, sustenta algo que pode cair.
Em outras línguas, como as anglo-saxônicas, é denominado brassière, do antropônimo francês Philippe Brassière, ou simplesmente bra. Os norte-americanos creditam a invenção do sutiã à debutante Mary Phelps Jacob, que em 1914 recebeu 15 mil dólares pela patente de uma peça do vestuário feminino que denominou soutien-gorge.
Mary abominava os espartilhos, usuais e tidos por elegantes naquela época. Inconformada em sair à rua com o corpo tão apertado, acolheu ideia de sua anônima criada francesa e amarrou dois lenços para segurar os seios, ligando um pano ao outro com uma fita.
A inventora jamais conseguiu comercializar aquela peça, mas desde então muitas empresas têm ganhado fortunas incalculáveis em todo o mundo fabricando sutiãs.
O costureiro e decorador francês Paul Poiret, em En Habillant l’Èpoque, atribui a si mesmo a invenção do sutiã para suas clientes. Também Otto Titzling é dado como inventor da peça, em 1912.
As mulheres da Roma Antiga usavam o strophium, um pano que mantinha erguidos os seios. A palavra latina era a mesma para designar a corda que amarrava o navio ao cais. A ideia, para os navios como para os seios, era a de prendê-los.
Famosas mulheres, muito conhecidas dos habitantes da Galáxia Gutenberg, não puderam contar com a ajuda de sutiãs para encantar aqueles homens que, antes de nós, se apaixonaram por elas. O Diccionario da Lingua Portugueza, de Antonio de Moraes Silva, cuja sétima edição, “melhorada e muito accrescentada”, foi impresso na “Typographia do editor Joaquim Germano de Souza Neves”, à Rua da Atalaia, em Lisboa, ainda não trazia a palavra sutiã.
Rastreando obras de referência ou romances, poesias, contos, crônicas e ensaios, não encontramos sutiã antes do século XX! Portanto, famosas e emblemáticas personagens femininas de Eça de Queiroz, de Machado de Assis, de Balzac, de Flaubert, de Shakespeare, de Dante, de Cervantes e de quantas mais dessas épocas pregressas, não usavam sutiã.
Hoje só não usa sutiã quem não quer! Nós, os que escrevemos, para fazer subtítulos que amparem nossos textos. As mulheres, para segurar o que a lei da gravidade tende a pôr abaixo. ”
Deonísio da Silva
Da Academia Brasileira de Filologia, Vice-reitor da Universidade Estácio de Sá e Consultor do Dicionário Aulete, escritor e professor.
Escreve semanalmente na revista Caras sobre Etimologia das Palavras.
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