Depois de um longo e tenebroso inverno, pelo menos para nós que estávamos saudosíssimas de nossa musa das artes plásticas, volta ao BLOG depois de um rolé pela Europa, a querida Vanda Klabin. E já chega abafando com o relato de uma exposição que está dando o que falar na França! Vamos curtir seu relato… BN
VANDA KLABIN: JOANA VASCONCELOS EM VERSAILLES!
“Joana Vasconcelos, artista portuguesa, é a primeira muher a expor nos Grandes Apartamentos e nos Jardins do Palácio de Versailles, dentro do programa experimental de arte contemporânea em diálogo e em confronto com a arquitetura desse histórico e emblemático espaço da cultura francesa. Iniciado em 2008, ali já tiveram suas obras espostas: Jeff Koons, Xavier Veilhans, Takashi Murakami, Beranard Venet.
O músculo principal dessa exposição é o aspecto feminino, “interpretar a densa mitologia de Versailles e transportá-la para a contemporaneidade, evocar a presença de importantes figuras que habitaram o palácio, apoiando-se na minha identidade e na minha experiência como mulher, portuguesa, nascida na França será, certamente, o desafio mais fascinante da minha carreira”, afirma Joana.
Joana apresenta 15 trabalhos com intensa conotação portuguesa e o país está no centro do seu discurso artístico. Ela utiliza objetos essencialmente femininos como leques, perucas, delicadas rendas e crochês, que entram em relação com diferentes aspectos da particular gramática do palácio e sua exuberante riqueza decorativa, gerando uma reflexão sobre a arte contemporânea e a identidade européia. Segundo o curador, seu trabalho é uma reapropriação de objetos do cotidiano de forma inventiva e inesperada, com uma reinvidicação feminina e irônica. A escolha de materiais reflete a diversidade da cultura portuguesa, presentes nas rendas do Pico, nas tapeçarias de Portalegre, nos têxteis de Nisa, na filigrana de Viana, nas panelas Silampos, na louça de Vista Alegre. Essa louça foi usada no jantar de inauguração da mostra, com menu elaborado pelo chef português portador uma estrela no Michelin, José Avillez.
Por ironia, a última rainha que viveu nesse palácio, Maria Antonieta foi decapitada e a exposição de Joana também, já que uma das obras mais importantes da artista, “A Noiva”, um imenso lustre feito com casacatas de vinte mil tampões higiênicos femininos ( OBs) pendentes que invocam o universo cândido das noivas, obra apresentada na Bienal de Veneza em 2005, foi decapitada, isto é, retirada do conjunto da mostra por ter sido considerada inconveniente, fato que muito desagradou a artista que considera a obra como parte do seu discurso feminino. A exposição teve um custo de dois milhões de euros.
( Vanda Klabin acaba de nos avisar que a obra “A Noiva”, que você vê acima, vai ser exposta no espaço alternativo de arte Centaquatre, em Paris, dos dias 5 de julho a 18 de setembro. Me lembrei do famoso “Salon de Refuses” que abrigou na mesma Paris, há cento e vinte anos, os primeiros impressionistas, pintores malditos de então… BN)
Em 2013, Joana Vasconcelos irá representar Portugal na Bienal de Veneza, em Itália. Joana Vasconcelos nasceu em Paris, em 1971. Vive e trabalha em Lisboa.
PERCURSO DA EXPOSIÇÃO:
MARY POPPINS, 2010 – Escalier Gabriel
É um quase objeto-lustre, um vasto corpo tentacular e colorido, criado a partir da combinação de tecidos e objectos pré-existentes, produzidos em série, com têxteis realizados manualmente em tricô e crochê, pendurado no teto. Mary Poppins – anjo da cultura popular dos tempos modernos – remete ao arquitecto que desenhou a escadaria da sala, Ange Jacques Gabriel.
CORAÇÃO INDEPENDENTE PRETO, 2006 – Salon de la Guerre
CORAÇÃO INDEPENDENTE VERMELHO, 2005 – Salon de la Paix
As obras reproduzem dois enormes corações de Viana – peça icônica da filigrana portuguesa –,e propõem duas versões monumentais em vermelho e preto, cores que reportam à paixão e à morte.
A forma dos corações é preenchida por milhares de talheres de plástico e correntes metálicas. Suspensas a partir dos respectivos eixos, os dois corações executam um movimento de rotação, evocativo dos ciclos da vida. Uma instalação sonora composta por canções interpretadas por Amália Rodrigues, diva da música portuguesa, acompanha essas obras e dialoga com as temáticas da paz e da guerra, presentes nas eloquentes pinturas de Charles Le Brun e François Le Moyne. As obras encontraram o título – Coração Independente – num dos versos do fado Estranha Forma de Vida cuja lírica aponta ao conflito entre emoção e razão.
MARILYN (PA), 2011 – Galerie des Glaces
Um monumental par de sandálias de salto alto, feitas de panelas e tampas em aço inoxidável, material resistente como as armaduras e escudos dos guerreiros que combateram nas guerras históricas. O par de sandálias remete ao gigantismo das conquistas femininas e às glórias que Luís XIV quis celebrar através nas pinturas de Charles Le Brun que decoram a sala, agora repetidos em um desconcertantante jogo de reflexos na fria superfície metálica de Marilyn
PERRUQUE, 2012 – Chambre de la Reine
De forma ovalada e inspirada na exuberância dos penteados que se exibiam em Versailles, este estranho casulo de vinhático, vagamente referenciável aos ovos de Fabergé – é pontuado por excêntricas protuberâncias de onde irrompem fios de cabelos loiros artificiais. Essa escultura-peruca-mobiliário, na sua forma uterina e decorada com aplicações metálicas douradas, trazem a reminiscência dos mobiliários português /francês e discursa sobre os dezenove partos que tiveram lugar no Chambre de La Reine, entre eles os nascimentos dos futuros Luís XV e Luís XVI.
LE DAUPHIN, 2012 . LA DAUPHINE, 2012 – Antichambre du Grand Couvert
Duas enormes lagostas de faiança desenhadas por Rafael Bordalo Pinheiro – importante artista português do século XIX, pintadas e recobertas por uma delicada renda em croché dos Açores, colocadas frente a frente, em contraste com as representações bélicas no teto, parecem aguardar a chegada dos monarcas onde a refeição real será servida.
GARDES, 2012 – Salle des Gardes de la Reine
Dois robustos leões, símbolos do poder patriarcal, feitos em mármore negro Port Laurent, do Paquistão, cobertos por uma segunda pele em renda em croché branco dos Açores, foram colocados lado a lado como sentinelas, fiéis guardiões das conquistas femininas.
A textura quente dessa monumental tapeçaria – que traz um efeito de vitral pela policromia do desenho, foi produzida em colaboração com Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, cidade portuguesa do Alto Alentejo e contrasta com as frias superfícies marmóreas da escadaria.
GOLDEN VALKYRIE, 2012 – Galerie des Batailles
VALQUÍRIA ENXOVAL, 2009 – Galerie des Batailles
ROYAL VALKYRIE, 2012 – Galerie des Batailles
Na Galerie de Batailles, onde se encontram trinta e cinco grandes pinturas que relatam um grandioso resumo da história militar francesa, estão sobrevoando as majestosas Valquírias de Joana Vasconcelos que parecem procurer ali , os mais bravos e valorosos guerreiros mortos em combate.
Gravitando no espaço, os enormes corpos têxteis de Royal Valkyrie, Golden Valkyrie,eValquíria Enxoval recrutam técnicas artesanais de um trabalho tradicionalmente feminino combinando-as com materiais e objetos diversos. Joana reinterpreta a moda palaciana de Versailles, recuperando o luxo e a exuberância dos brocados de motivos florais, contrapondo a riqueza e a falsa aparência.
Golden Valkyrie referencia o ouro, o mais precioso dos metais, fazendo conviver o brilho de tecidos dourados nobres com crochê de lã feito à mão
Valquíria Enxoval aponta para uma estética do meio rural, exibindo cores, motivos e técnicas tradicionais de Nisa, pequena cidade do interior de Portugal, conhecida pela riqueza do seu artesanato.
Royal Valkyrie é uma obra fita em crochê e tecidos, produzida em colaboração com as artesãs de Nisa
Um helicóptero Bell 47, revestido a folha de ouro e decorado com milhares de brilhantes Swarovski , é recoberto por penas de avestruz em tons salmão, rosa e laranja. O interior, suntuoso, é decorado com madeiras trabalhadas e dourados e tapetes Arraiolos
Essa obra que encena a mais desconcertante aproximação ao universo estético de Versailles e toma emprestado a estética da realeza do fim do Antigo Regime. Lembra uma máquina do tempo que transporta a rainha c francesa até à cena contemporânea.
Obra produzida com a colaboração da Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva, Lisboa
Instaladas em cada um dos dois lagos em frente ao terraço, é um obra monumental constituída por duas estruturas verticais gêmeas, que resultam da acumulação de milhares de garrafas de champagne Pommery feitas em ferro metalizado iluminadas a partir do interior por LEDs de alto brilho. Visíveis, também, a partir do interior da Galerie des Glaces, as duas obras introduzem uma verticalidade contrastante com as imensas linhas horizontais dos jardins e do palácio.Blue Champagne, reporta ao primeiro ready-made de Marcel Duchampm, a obra Porte- Bouteilles e aos prazeres da mesa, tema também tratado na estatuária em frente ao edifício central
PAVILLON DE VIN, 2011 – Parterre du Midi
PAVILLON DE THÉ, 2012 – Parterre du Midi
São duas enormes estruturas em ferro forjado, dispostas lado a lado. Uma reproduz a forma de um garrafão de vinho e a outra, adota as linhas de um bule de chá. Essas esculturas /caramachão –receberam plantas de videiras e de jasmim no que percorrem as estruturas numa harmoniosa combinação entre o industrial e o natural.” Vanda Klabin
FICHA TÉCNICA:
EXPOSIÇÃO JOANA VASCONCELOS
LOCAL: Palácio de Versailles
DATA: De 19 de junho a 30 de setembro de 2012
COMISSÁRIO DA EXPOSIÇÃO: Jean- François Chougnet
Vanda Klabin, Historiadora e Curadora de Arte.
Tel: +55 (21) 2267-2662
Cel +55 (21) 9986.9256
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